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Bom Jardim de Minas - Notícias
28/01/2016 17h01

Homenagem Especial: Vicente Mauro

O Resgate de uma história: Vicente Mauro e a Imigração Italiana em Bom Jardim de Minas.

Por Enderson Hebert de Souza

 

Vincenzo Maria Mauro, nome de batismo, nasceu aos 31 de agosto de 1846, às 12h de uma segunda-feira, na cidade de Laurito, província de Salerno, região da Campania, sul da Itália. Filho legítimo de Filippo Mauro e Carmela Sagaria, casados em 08 de fevereiro de 1834, neste mesmo município. Foi batizado por seu tio materno, Padre Pasquale Sagaria, na Igreja de São João Batista. Seus irmãos eram: Pasquale, Antonio, Giuseppe, Giovanni e Dorotea. Neto paterno de Antonio Mauro e Dorotea Santolia, e materno de Vincenzo Sagaria e Gaetana Speranza. Na escola, demonstrou aptidão pelas ciências exatas. Aprendeu com os seus pais o ofício da agropecuária. Posteriormente, registrou-se no serviço militar. Após a morte da mãe, no dia 01 de abril 1851, com ampla reserva financeira, deixa a Itália. O pai falece aos 15 de março de 1879.

Chegou no Brasil em 1871, aos 25 anos de idade, juntamente com seus 2 irmãos, Padre Pascoal Mauro e Antonio Mauro, fixando residência no Distrito do Bom Jardim, pertencente a antiga cidade do Turvo, hoje Andrelândia. Trazendo consigo uma canastra repleta de ouro, adquiriu casa e abriu um comércio, ao lado da mesma, chamado Vicente Mauro e Companhia, onde se vendia armarinho, louça, ferragens, sortimento de fazendas, molhados e completo gênero. Posteriormente, obteve terras num lugar denominado Imbutaias. Comprou quinhentos alqueires de terras e mais a sede da Fazenda Boca do Mato. Contratou dez empregados para trabalhar na fabricação de queijos e manteigas, bem como cuidar do jardim e pomar, plantações de milho e feijão, além dos muitos cavalos, gados, porcos e galinhas. Exigia que os cães de caça fossem treinados e tratados pelo filho José Mauro, à base de carne, leite e angu.   

Italiano determinado, alto e de olhos castanhos, cabelos claros e bigode, fumava cachimbo, usava chapéu couro de lebre e bengala, sapatos pretos, paletó e colete, onde guardava o relógio de bolso, inteiramente em ouro, preso pelo grosso cordão dourado que vinha até a calça. A refeição predileta dele era macarrão, feijão, mostarda, ovo frito e um bom vinho. O assunto preferido era a caça de veados. Preparava-se para estas grandes caçadas, aperfeiçoando a mira com tiros de cartucheira nos gargalos das garrafas, levando um cargueiro e mais 20 cachorros americanos. Reunia os amigos italianos e se aventuravam pelos lados de Liberdade ou Andrelândia, ficando ausente por uma semana.

Iniciando o ano 1892, amigou-se com a viúva Emília Theodora de Jesus. Dessa união tiveram 10 filhos: João, José, Praxédes, Alcídia, Maria, Rosária, Carmela, Geralda, Noêmia e Herculina. Os nomes deles eram uma homenagem aos parentes da Itália. Para provar a valentia dos dois filhos, obrigava-os a matar porcos todos os meses. Comia a carne e o toucinho dava aos colonos, permitindo-os fazer festinhas animadas. Quando o circo chegava à cidade, levava os filhos para se divertirem com ele, comprando-lhes pipocas e doces. Habitava em Bom Jardim pelo fato de ser vendedor, mas vinha à fazenda de noite, todo final de semana, galopando disparado em seu cavalo, com uma bandana amarrada na cabeça, e dava três tiros ao alto para avisar que estava chegando ali, pois havia sentinelas. No retorno, acompanhava as tropas a fim de despachar os derivados do leite. Fiscalizava tudo, nada passava desapercebido.

Aos poucos, conquistou o respeito e a admiração de todos. Sendo um dos principais agricultores e criadores da região, tornou-se Coronel. Compareceu ao ato da instalação da Comarca do Turvo e recebeu com o irmão Padre Pascoal Mauro, na casa paroquial, a ilustre visita do deputado federal, Visconde de Arantes, em 1892. Por ser eleitor e negociante, foi nomeado Conselheiro Distrital do Bom Jardim e contou com ajuda de amigos para criação da primeira Corporação Musical Clube Bonjardinense, sendo o seu primeiro diretor, porém com a regência do renomado músico e professor Cornélio Nunes, no ano 1893.

Como cidadão, pagava retamente os seguintes impostos distribuídos: lançamento sobre fazendas de criar, concernente a 1900, mencionava o valor de 5.000 contos de réis, enquanto a taxa sobre prédios, relativo ao decurso de 1915, citava a quantia de 8.640 contos de réis, calculados da importância total deste patrimônio, avaliado em 288.000 contos de réis. Assim, obteve o respaldo do fiscal de Bom Jardim para construção de 3 paredões rente sua residência.   

À medida que os filhos foram se casando, presenteava-os oferecendo 10 alqueires de terras e mais 10 vacas leiteiras, bem como joias italianas e vestido de noiva para as filhas, sem falar do almoço festivo realizado na sede da fazenda Boca do Mato. Ali havia um salão enorme, usado para receber pessoas ilustres, familiares, amigos e convidados, onde também se fazia belíssimos bailes, especialmente naquelas ocasiões memoráveis. Os pretendentes das filhas deveriam ser homens honestos e trabalhadores, capazes de fazê-las felizes e lhes garantissem uma vida digna. Chegou a expulsar das terras da sua propriedade, a tiros de espingarda, alguns rapazes que afrontaram-no, e não desejavam assumir compromisso com nenhuma delas. A caçula Rosária, fugiu da residência para se casar com um forasteiro, sem o consentimento do pai. Contrariado, mediante o forte temperamento italiano, imediatamente resolveu deserdá-la de todos os direitos, servindo de aviso para todas as outras. Por essas atitudes impunha o respeito necessário, sendo até mesmo temido pela família, empregados e demais pessoas.      

Vicente Mauro convidou o irmão, Vigário do Bom Jardim, local de moradia adotado por ambos, para um almoço em sua afamada fazenda. Conversaram longas horas sobre diversos assuntos, especialmente as reminiscências das origens italianas. Ele também chamava a atenção do padre, pelo fato de usar a cédula do dinheiro como papel de cigarro, quando a palha acabava, a fim de fumar. Após tomarem algumas garrafas de vinho, os nervos se exaltaram por causa de uma escritura paroquial estar sob o poder do fazendeiro, iniciando uma acirrada discussão que só terminaria com o rompimento da amizade deles, quando o próprio deu um tapa no rosto do irmão sacerdote. Desgostoso, Padre Pascoal Mauro resolve se desligar da Diocese de Mariana, pedindo ao Bispo, Dom Silvério Gomes Pimenta, permissão de deixar o Brasil e retornar definitivamente à Itália, Laurito, onde faleceu pouco tempo depois, no dia 19 de julho de 1909.

Já idoso, gostava de contar histórias aos netos e também ensinava-os a cantar lindas melodias na língua italiana. Chegou a esconder um deles, pelas bandas da Boca do Mato, a fim de impedir que fosse alistado, mas não adiantou muito porque o exército encontrou-o. Deu o nome do ditador fascista italiano Mussolini a um dos netos. Tinha a mania de usar um pedacinho de pau para afiar os dentes e quando estes caíam, guardava todos eles numa caixinha. Nesse período de quase 60 anos de Brasil, apenas visitou a Itália duas vezes, matando a saudade da terra natal. Próximo de lhe findar a vida, vacilando um pouco, ocorreu a separação do casal, devido a descoberta, pela mulher, de um relacionamento extra conjugal de duas décadas, que resultou numa filha ilegítima. Emília Theodora de Jesus preferiu morar na sede da Fazenda, onde morreu no início de 1950, com 86 anos. Vicente Mauro faleceu, pelos idos de 1930, aos 84 anos de idade, em sua residência urbana, por causa da senilidade e desidratação. Inúmeras pessoas participaram do velório e do cortejo. Foi sepultado no cemitério de Bom Jardim de Minas.

Após a morte dele, surgiu uma incógnita: não há registro algum do óbito, tanto do Cartório do Registro Civil quanto da Paróquia Senhor Bom Jesus de Matozinhos. Os filhos e mais a viúva se viram obrigados a deixar aquelas terras rurais, pois as novas escrituras apresentavam outras pessoas como proprietários, inclusive da própria casa urbana. Provavelmente, enfermo, tenha sido induzido a assinar os papéis, por amigos próximos a ele. Todos seus pertences pessoais, tais como: ouro, documentos e fotografias, desapareceram misteriosamente. Não obstante, sua memória permanece viva nos corações dos bonjardinenses e familiares.

 

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