por Alcione Magalhães Ferreira
Domiciano Ferreira Martins, vovô Dico, conhecido por “Sô Dico”, filho de Prudenciana Flora de Oliveira e José Ferreira Martins (Zeca), nascido em1887, foi casado com Maria Augusta Junqueira de Andrade, com quem teve 11 filhos: dois mortos recém-nascidos; Paulo, Zalpha, Messias, Pedro, João, Geraldo, Manoel, Gabriel e Antonio Carlos.
Quando ele faleceu, em junho de 1967, aos 80 anos, eu ainda não havia completado 12 anos, e embora a nossa convivência tenha sido curta não deixou de ser intensa.
Dos seus cafés - que a todos oferecia no alpendre de sua casa -, borbulhantes como aperitivos, ia para o pedacinho do cigarro de palha, aceso por um fósforo partido ao meio, tamanha a sua economia.
Era no alpendre que recebia os amigos, filhos e netos para um “dedo de prosa”, um bom conselho ou uma palavra de consolo, para onde vinha correligionários, candidatos, e onde se concentravam eleitores sob suas orientações, pois fôra um político apaixonado, chefe de partido, caçador de candidatos e arrebanhador de eleitos.
Vovô Dico foi um desbravador. Adentrava sertões em busca de boiada. Utilizando-se de seu empreendedorismo rural conseguiu tornar-se um grande fazendeiro em Cruzília. Chegou a possuir muitos alqueires de terra, com a luz interior inerente à sua pessoa, a sua esperteza para contar moedas, com a força de seu trabalho.
Com a filosofia de vida que lhe era peculiar, criou os seus filhos e netos mais velhos, sempre patriarcal, e acumulou o seu patrimônio: “Bongue”.
Na varanda da sede, à tardinha, ainda ouço o toque do violão do tio Neneco, acompanhado pelas vozes sonoras de tia Wilma e mamãe entoando genuínas músicas brasileiras com o reconhecimento efusivo do vovô - “Pastos dos Potros”, “Os vinte”, “Nossa Senhora das Graças” (herança que meu pai recebera, onde nasci, onde ficaram as lembranças da minha infância e a dos meus irmãos); “Boa Vista”, “Santa Luzia”, “Picada”, “Santa Helena”, “Campo do Ribeirão”. E que ofertou uma a cada um de seus filhos.
Suas fazendas, antes de tudo, abasteciam a si mesmas. Dedicavam-se à pecuária, além do cultivo do milho, cana-de-açúcar, arroz, feijão, hortaliças e café. Produziam carne, leite, queijo e ovos.
Nelas não havia trabalho forçado. Os empregados eram amigos, e todos tinham as suas moradias, as suas próprias colheitas, tudo fluindo com harmonia.
Era adepto de um Brasil agrário, sem exploração para com o outro e para com a natureza; vida alicerçada na simplicidade, porém plena de fartura, sem o apego aos encantos consumistas que as cidades emanavam.
Não é preciso enumerar fatos e feitos de um homem para torná-lo grande. Estres se vão com a rigidez inexorável do tempo. O que o tempo não desfaz é a essência daqueles que amamos.