Um grupo internacional de pesquisadores diz ter descoberto um possível planeta habitável fora do Sistema Solar.
Mas é melhor ir com calma: o que o novo estudo faz melhor é mostrar como é delicado o trabalho de procurar exoplanetas.
A descoberta foi feita usando dados do espectrógrafo Harps, do ESO (Observatório Europeu do Sul), o mais preciso do mundo para buscar planetas extrassolares.
Contudo, o trabalho não é fruto de uma nova leva de observações, mas de dados antigos, garimpados dos arquivos da organização.
A estrela, designada HD 40307, é parecida com o Sol, mas um pouco menor e mais fria (cerca de 70% da massa solar), localizada a 44 anos-luz da Terra. (Um ano-luz equivale à distância que a luz percorre em um ano, cerca de 9,5 trilhões de quilômetros.)
Com as observações originais, pesquisadores europeus já haviam descoberto três planetas, todos muito próximos da estrela para abrigar água em estado líquido --principal qualidade para a habitabilidade.
Usando uma nova técnica de análise, a equipe liderada por Mikko Tuomi, da Universidade de Hertfordshire, no Reino Unido, e Guillem Anglada-Escudé, da Universidade de Göttingen, na Alemanha, conseguiu extrair sinais de outros três mundos orbitando HD 40307.
O mais interessante deles completa sua órbita (um ano naquele mundo) em cerca de 200 dias terrestres. Como a estrela é um pouco menos brilhante que o Sol, ele está na posição certa para abrigar água em estado líquido na superfície.
E o melhor de tudo: ele tem cerca de sete vezes a massa da Terra, o que o coloca numa categoria de planeta que possivelmente tem solo rochoso --as "super-Terras". É interessante notar que não há análogo desse tipo de mundo no Sistema Solar.
BAMBOLÊ ESTELAR
A técnica mais consolidada --e usada pelo Harps-- para detectar planetas é observar pequenas modificações na luz da estrela, causadas por seu movimento. Se o astro está se aproximando de nós, sua luz fica mais azulada. Se ele está se afastando, a luz fica mais avermelhada.
Essa variação, por sua vez, pode ser correlacionada com o efeito gravitacional que possíveis planetas --pequenos demais para serem observados diretamente-- causam na estrela, conforme giram em suas órbitas.
Só que a coisa fica mais complicada que isso. É preciso extrair outros efeitos (como variações naturais no brilho da estrela) e conseguir separar os efeitos individuais de cada planeta.
O novo software desenvolvido pelos pesquisadores é um avanço no sentido de melhorar a interpretação desses dados, aumentando a precisão das descobertas.
Só assim eles puderam encontrar o possível planeta habitável, designado HD 40307g. Mas o resultado não é incontroverso, a ponto de os próprios descobridores tratarem o objeto como "candidato", ainda carecendo de confirmação mais sólida.
Astrônomos não envolvidos com o achado se mostram céticos. "O fato de que eles colocam em dúvida no trabalho a própria natureza da descoberta já diz tudo", afirma Cassio Leandro Barbosa, astrônomo da Univap (Universidade do Vale do Paraíba), em São José dos Campos (SP). "Para mim é o desejo de encontrar um planeta rochoso na zona habitável em uma distância que alguma missão seja capaz de alcançar em escalas de tempo razoáveis em alguma época futura."
A boa notícia é que, a 44 anos-luz daqui, de fato esse possível planeta estaria ao alcance de uma futura geração de telescópios espaciais, como o Terrestrial Planet Finder, da Nasa, e o Darwin, da ESA, que buscarão detectar diretamente a luz vinda desses astros.
"É o primeiro planeta na zona habitável no regime de massa das "super-Terras" que poderia ser alvo desses observatórios planejados", dizem Tuomi e seus colegas, no artigo aceito para publicação no periódico "Astronomy & Antrophysics".
Com a luz, seria possível identificar, por exemplo, a composição atmosférica desses mundos. Se HD 40307 tiver grandes quantidades de oxigênio em sua atmosfera, é certo que o planeta não só é habitável, como também é efetivamente habitado (pelo menos por criaturas capazes de fotossíntese, como plantas).
Fonte: Folha de São Paulo