Parte da
historia não contada
Do Boi Estrela
Que na verdade
antecede
A palavra escrita
Era que o Boi
antes de se chamar
Estrela
Se chamava
Boi Brasil
Ê Boi!
Boi que desmorreu
Pelos índios
Boi
Que no seu galope solar
Vai deixando rastros
De pedrinhas
Miudinhas indicando
Sua morada
Nas veredas de Aruanda.
Parte dessa história
A que não foi contada
É que o fazendeiro
Que sequestrara
O colosso e
se achava dono
Do Boi Brasil
Era o Capiroto
O Sete Peles
Cramunhão
O Coiso
O Coiso.
E o Coiso queria
Ser dono do Boi
Que era forte
E bendito
De cura
Sabia achar a água
Pro ribeirinho
E rodava o moinho da cana
Ê Boi Brasil!
Mas o que se
Aconteceu na história
E que a palavra
Não escreveu
É que o Boi Brasil
Queria ser Estrela
Livre no verde
E no azul
Vivendo no meio
De um cruzeiro
Celestial.
Foi assim que o Boi
Transou um plano.
No seu canto
Matutino
Enfeitiçou dois peregrinos
O nêgo Chico e a menina
Catarina
Cada um vivendo
No seu lado oposto
Do Rio
Se olhavam
De longe
E sonhavam
Com o gosto
Do desconhecido
E foi pelo canto
Do Boi feiticeiro
Que os dois se lançaram
Para dentro do rio
Nadando em fortes
Braçadas
Daqueles que
Não temem a própria
Morte
Nem fogem à luta
Dois se fizeram
Um num abraço
Que virou canoa
E os conduziu
Pelas correntes do rio
À uma cachoeira
Que corria
Para cima
Em grandes explosões
Leitosas
A cachoeira
Corria e subia
Subia
Subia
Subia
Contrariando toda
Gravidade
Celebrando toda
A leveza de ser.
Desse nadar
Pelo tempo
Eis que na terra
de Catarina
E Chico
Despertaram
As primeiras sementes
De Jurema
E o Boi Brasil
Impávido
Cantou para Catarina
E Chico
Uma canção
Tântrica
Um mantra
De comunhão.
Chico e Catarina
Apaixonados
Pelo gigante
Dão as mãos
Para libertar
O Boi Brasil
Mas o Coiso
Espreitando em sua
Covarde armadilha
Disparou um tiro
Ardiloso no casal
Que tentava abrir
A porteira
Da terra de todos
O Boi
Em seu salto
De búfalo
Se fez de escudo
Para o amor.
O Coiso
Em sua covardia
Perseguiu o casal
Marcando
a culpa
Da tragédia
Nos dois que
Quase nada tinham
A não ser um
Ao outro
E seu rio
Rio que nunca
Parou de correr
E que ainda
Hoje
faz o moinho girar.
Catarina e Chico
Em suas fugas
Encontraram lobos
E homens
Que mais lembravam
Carniceiros
Mas sua sina
Não se findou na
Mão do torturador
E foi na casa do Pai
Da Mata
Que descobriram
Sua rendição
Com o peso do
Boi nas costas
Cantaram e dançaram
Com o pajé
Uma canção
Eis que o Boi Brasil
Se levantou
E em seu voto de
Raios cintilantes
Brilharam as escamas
De Oxumaré
Boi Brasil
Se transformou
Em Boi Estrela
Subindo aos céus
Iluminando
A vida dos peregrinos
Que desviam
Seu caminho do
Coiso
Sem temer
Um novo amanhã.
Quem me contou
Essa história
Foi meu avô
Sentado em
Seu banco
Fumando seu cachimbo
Me mostrando o
Rastro do Boi Estrela
Mas pedrinhas miudinhas
Que todo dia encontro
No caminho
E meu avô dizia:
É preciso conhecer
A história
É preciso conhecer
A história
para
Se desviar
Das artimanhas
do Coiso.
Se o Coiso te chamar
Você vai com ele?
Com ele não, com ele não.