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Opinião
11/04/2019 09h43

Pequenos e silenciosos abandonos

Por Ana Terra Oliveira

Silencioso, inconsciente, imperceptível, sem nenhuma intenção, mais parece cobra sorrateira. Perigosamente invade as relações parentais. Muitos pais conscientemente nunca abandonariam os filhos e aparentemente não abandonam. É o tempo! Mas abram os olhos e o coração, o tempo pode exigir vigilância! A modernidade líquida, que o Bauman nomeou, nos permeia com seus modos e costumes e todos nós precisamos de consciência!

Os pais, se perguntados, desejam dar aos filhos uma ótima educação, valores humanos, afeto, carinho e um futuro brilhante. Os pais fazem de tudo para dar aos filhos o que acreditam ser importantes para seus desenvolvimentos pessoais. Mas é necessário se questionar, olhar para dentro de casa e observar com cuidado: será que o ideal que moveu a formar família, ou sonharem com o nascimento dos filhos na prática se aproxima de uma realização razoável e coerente com o ideal?

É sempre lindo ver sonhos sendo traçados e uma rica experiência de vivências com os filhos! Os pequenos dão milhares de motivos para os pais sorrirem e gargalharem de suas atitudes inusitadas e jeitos de ser irreverentes, a medida que vão crescendo. Mas também necessitam de ser educados, corrigidos, orientados. É preciso encontrar maneiras de lidar com as birras, os choros, as travessuras. São as oportunidades desafiadoras, nem sempre fáceis, mas nunca podem ser negligênciadas a terceiros, é função do pai e da mãe colocar limites e os ajudar a amadurecerem.

Aí está o ponto, amparar os filhos materialmente, cuidando da saúde do corpo; espiritualmente educando com valores e ensinando virtudes; psicologicamente oferecendo afeto, e recursos para desenvolvimento mental, emocional e cognitivo.

Fato é que nem sempre os pais aprenderam como fazer, é bem verdade, nem sempre estão preparados. E digo: nunca estarão! Pois, ter um filho é uma nova experiência nunca antes vivida e te coloca em uma posição totalmente desconhecida: a de pai e de mãe. 

A questão é: por ser desconhecida, por ser uma nova experiência vai exigir esforços, empenho, dedicação, vontade de aprender, desejo de crescer com a experiência, de ser melhor, as vezes, buscar ajuda, buscar informação e também desfrutar deste privilégio. Como tudo na vida, não é mesmo? Mas não é justificável negligenciar a função por inúmeras outras justificativas!

Aí está o ponto! No mundo de hoje, as vezes, quer dizer, com bastante frequência, pais da nossa geração preocupam-se demais com os próprios desejos, com os próprios projetos, com os próprios sonhos, com os próprios trabalhos e colocam em um plano a parte, um segundo ou terceiro plano, a relação com os filhos. Não que não seja importante cuidar de si mesmo, pelo contrário, é muito importante cuidar de estar de bem com a vida, estar mais equilibrado, isso vai influenciar positivamente os filhos.

Digo do egocentrismo que existe entre as pessoas, os excessos, os maus costumes desta modernidade. E sem querer, o abandono vai acontecendo, silenciosamente. É um tal de atrasar para buscar na escola, até que vira um esquecer de buscar o filho; é falar tanto no celular até que se fala mais no celular do que se olha para o filho. É olhar tantas mensagens de zap e postar coisas no insta que conversar com o filho vira incômodo. É ficar até mais tarde no trabalho até ficar só no trabalho e virar visita esporádica na própria casa e não perceber que o dentinho caiu, que o filho está sempre triste e calado. É dar tantos brinquedos e ser impossível tirar um tempo para brincar e dar carinho. Brinquedos não promovem afeto por si próprios. É dar tantas roupas, viagens, e eletrônicos e não se preocupar em dar valores, corrigir, ensinar o certo. Você anda cansado demais e não tem disposição para dar limites. E não percebe que quem está dando os limites é o youtube, é de lá que vem as referências, os exemplos. Quem está educando essas crianças e adolescentes? O YouTube? Você sabe o que seu filho visualiza entre um videozinho e outro? É dar tantas opções às crianças que elas ficam ansiosas.

Sabe, isso tudo parece muito duro de ouvir! Mais duro ainda são os pequenos prejuízos, dos pequenos abandonos, silenciosos e imperceptíveis, que se tornam grandes problemas e transtornos. Não traçam o futuro digno e brilhante que foi sonhado por você, não traçam nem um futuro lá na frente, porque as consequências já são bem mais imediatas, as consequências não tardam muito em chegar, não são como eram antes, elas acontecem imediatamente. O que elas traçam é um presente de desajustes e dor. E eu vejo, eu vejo adolescentes querendo buscar saídas para as carências e as sensações nas drogas. Perdidos, sem nenhuma motivação, sem ânimo de viver e estudar. Incertos de propósitos, não sabem para onde ir. Eu vejo crianças e adolescentes falando que a vida não tem sentido, e que não sabem porque, mas pensam ou já pensaram que seria melhor não viver. Eu vejo o sofrimento de se sentir esquecido, abandonado. Mas não faltam comidas e eles vão ter que conviver com a diabetes, a hipertensão e as comorbidades!

E o que fazer agora? Olhar para dentro de casa, deixar-se tocar, reconhecer a seriedade, tomar nas mãos a responsabilidade, esforçar em fazer diferente, buscar auxílio quem sabe. A vida tem jeito e é isso o que eu faço: eu insisto que a vida tem jeito. Nós temos jeito e essa é a minha grande aposta, por isso eu continuo, por isso eu luto. Nisto eu acredito fortemente. O presente e o futuro brilhante não vem só do desejo, depende do empenho correto, de esperança constante, atitude coerentes, e quando não mais estiver ao alcance, entrega!

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