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Opinião
15/01/2015 15h15

Quinzinho, dos mares aos trilhos

José Luiz Ayres

De repente, meu saudoso pai; Luiz Ayres, que entre tantas vezes se chegava à bilheteria da estação férrea D. Pedro II, posteriormente intitulada de Central do Brasil, é abordado por alguém a tocá-lo ao braço. Ao virar-se, se surpreende na presença de um cidadão de baixa estatura, franzino, tendo à cabeça um chapéu enterrado trajado com terno e gravata a portar duas malas, as quais apoiadas ao chão, saca o chapéu e sorridente o estende a mão a dizer:

- Luiz, há quanto tempo que não o vejo! Luiz perplexo, arregala os olhos a expressar o sorriso e o responde:

- Quinzinho, que alegria em vê-lo amigo! Mas o que faz aqui a conduzir estas malas, vai viajar? E o nosso São Cristóvão como esta?

Quinzinho, era o responsável pelas garagens náuticas das guarnições esportivas e dos equipamentos de competições de remo dos clubes: São Cristóvão, Boqueirão, Internacional e Vasco da Gama, instalados no antigo calabouço – hoje seria onde localiza-se o início do aterro Parque do Flamengo à altura do museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro, e que também era solicitado, pela sua compleição física, a ser o patrão nos barcos: iole a oito, e quatro com, durante os treinos e competições das guarnições do São Cristóvão, onde tinha o vínculo empregatício como orientador e guia aos remadores.

Quinzinho, todo domingo participava do treino estirão da iole a oito do São Cristóvão, em que Luiz como o quarto remador (meeiro de força) da guarnição, fazia parte da equipe cujo treino constituía-se na travessia da baia de Guanabara até à cidade de Niterói em ida e volta e, a cada dois meses até à ilha de Paquetá, sempre a ter Quinzinho como patrão a traçar o rumo, a orientar e incentivar a cadência das remadas nas extenuantes jornadas.

Entre recordações, trocas de lembranças e tantos assuntos, pois não se viam há anos, desde que Luiz deixou o remo, eis a dolorosa surpresa, ao saber que o São Cristóvão o havia dispensado e passa a dedicar-se a profissão de origem de operador de máquina de costura na confecção de bonés, boinas e similares, o que aliás já fazia à garagem do clube a prestar serviços à firma; OG-Nogueira, em confeccionar seus produtos dada à disponibilidade de tempo durante a tarde. Só que por solicitação do empresário, depois de deixar o clube, foi indicado a ser caixeiro viajante em melhoria salarial e há um mês luta a vender os produtos sem ter a quem recorrer num ensinamento ou apoio, a orientá-lo nesta árdua e complicada tarefa de vender. A final sua vida fora até então dedicada a costurar bonés a complementar seu sustento e ter no, mar a base de tudo.

Luiz, triste ao ver o momento angustiante do amigo, a partir de então, o propôs ajuda a lhe oferecer que o acompanhasse nas suas andanças no intuito de apresentá-lo aos comerciantes, seus fregueses, consumidores da sua linha têxtil, vez que os produtos por ele oferecido eram em área correlata. Agradecido, Quinzinho passou a ser seu fiel seguidor, a deixar os barcos pelos trens, os quais se tornaram parte integrante da sua nova etapa de vida como caixeiro viajante. Sob supervisão de Luiz, cuja vivência profissional era o seu referencial, acabou se transformando não só junto a empresa, mas ter sua alto-estima recuperada, num excelente vendedor, a ponto de ser pelo patrão, oferecida à sociedade da OG-Oliveira neste curto espaço de tempo independente das vendas. Dinâmico e tocado pela sociedade, seguiu com afinco sem mãos a medir à tarefa, sempre com o apoio de Luiz, onde inclusive por sugestão, sugerir á criação de bonés personalizados as empresas e indústrias, a exporem logomarcas bordadas, inseridas no frontal acima da pala protetora do sol, o que se transformou num sucesso de vendas, tal à procura. Inclusive, passou a presentear ao pessoal das ferrovias mineiras, pelo carinho e tratamento a ele dispensados durante as locomoções e circulações às estações férreas, a torna-se amigo de todos e querido pelo carisma e humildade que o qualificava, sustentado pelo carinhoso apelido de “Quinzinho dos bonés”. E assim projetou-se em total prosperidade nos 15 anos que como caixeiro viajante, a viver a cruzar este chão mineiro através dos trens a arrebanhar grandes amizades, sem deixar de reconhecer à eterna gratidão pelo amigo de remadas: Luiz Ayres, e o que teve por ele, mesmo depois de deixar a profissão a tornar-se um comerciante de laticínios no Rio de Janeiro, onde o visitava com frequência.

Certa vez, Luiz ao folhear o jornal, se consterna e se emociona ao ler o anúncio fúnebre convidando à cerimônia religiosa da missa de 7° dia do saudoso amigo Quinzinho, cujo passamento, de acordo com seu filho, deveu-se pela grave depressão ocasionada pelo falecimento da mulher e o encerramento obrigado de sua empresa, pela falta de pedidos, ”soçobrar” nestes mares revoltos da industrialização e tecnologia, que como um “Tsunami”, baniu o lirismo de uma época a arrastar tudo a sua frente, inclusive os trens do nosso poético interior, cuja lembrança se sucumbe a cada geração a extinguir até a saudade, como a fumaça dos trens que toldaram os céus e dissipadas pelos ventos da modernidade.

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