O empresário enfrenta como líder do seu negócio dúvidas e mais dúvidas no seu processo de decisão. Na prática, as principais dúvidas são eliminadas na medida que os acionistas colocam com relativa clareza suas crenças e valores, seus objetivos, seus planos de ação, ou seja, seu modelo de negócio e de gestão. Interessante é que na formulação de crenças e valores, orgulhosamente expostos na entrada das empresas e em toda a publicidade, participam em geral os acionistas e seus prepostos, mas são poucos os casos em que os funcionários que devem aplicar essas crenças e valores participam da discussão.
A questão não é fazer um credo de valores, mas aplicá-los na vida diária da empresa e também ter a humildade de ver e rever o que esta acontecendo com a aplicação dessas crenças.
Vejam o caso da Vale em Mariana e Brumadinho. O que a empresa diz nas suas crenças e valores face ao que está sendo aplicado na prática nas suas operações e no caso do gerenciamento de uma crise que provocou em conjunto mais de 300 mortes. Aliás, seria interessante ver quais eram os valores da época da CVRD, estatal, versus os da Vale privatizada. E também dos seus acionistas, fundos de pensão oriundos das estatais brasileiras.
Como, neste momento de crise da empresa, aliás ampliada pelo ciclone em Moçambique, onde a Vale tem operações importantes, devem agir seus dirigentes e seus funcionários.
No nível mundial há dois exemplos de disparidade entre a imagem da empresa e as sus ações: o da Volkswagen, com a falsificação de dados referentes ao uso de diesel nos seus carros, e o da Boeing no recente caso dos aviões série Max, com a discussão sobre o software teria ou não provocado os acidentes.
É fácil escrever o que você quer acreditar. E difícil aplicar. Em especial no Brasil, onde o jogo do interesses se sobrepõe a qualquer insistência em ser ético. Por exemplo, como o empresário reage quando coagido pelos fiscais. Ou você paga a propina, ou paga a multa ou enfrenta um processo milionário nos tribunais. Você está entre a cruz e a caldeirinha.
Todos temos que tomar uma decisão ética todo santo dia. A liberdade de escrever tem limites de pressão de anunciantes ou patrocinadores que determinam dentro de seus interesses a fronteira da liberdade. Veja o caso recente da EMBRATUR e o cantor Alceu Valença.
O debate político empresarial também tem seus limites no horizonte dos interesses. De certa maneira não se espera, vamos dizer, uma pureza ideológica nesse caso, uma vez que a ideológica do empresariado é baseada na obtenção de ganhos financeiros, mas onde estão os interesses da sociedade e os interesses financeiros das empresas. Onde estão os limites nas entidades empresariais para debates sobre os rumos da economia e da sociedade versus interesses de supostas lideranças ou de grupos que detém o poder e a chave do cofre?
O debate sobre ética, aliás em geral cada um a define de acordo com sua visão, sua ideologia, seus interesses, sua religião, é interminável, mas sobrevive a versão que tem respaldo da maioria, inclusive respeitando a minoria. É um debate complexo, mas não se declara como ético algo que não se cumpre. Mais cedo ou mais tarde a conta vem. E as dúvidas nesse caso, como temos visto todo dia na vida empresarial, matam.
Stefan Salej
Ex Presidente do SEBRAE Minas e da FIEMG
Vice Presidente do Conselho de Comércio Exteriore da FIESP
Coordenador adjunto do GACINT Grupo de análise da conjuntura internacional da USP